sexta-feira, 7 de setembro de 2012





                               Sabes, amor…

Sabes, amor…

Agora tudo ficou mais difícil

Chegou o momento que eu sempre temi

Aquele momento em que nada me oferece grandeza

Em dosagem suficiente para me deixar seguro

De ter chegado sequer aos teus pés, que sim, são belos

É o próprio nada que me incomoda porque se ao menos

Quantificasse a minha própria insignificância

Se pelo menos servisse para me livrar

Desta raiva envergonhada que me aperta o peito

Por saber que não mereço o teu regaço

Por sentir a pequenez que me atrofia

A alma e mais desgraçadamente

O pensamento

 

Sabes, amor

Eu quis fazer de Neruda e tentei escrever-te uma ode

Mas as palavras desentenderam-se e não mais rimaram

Eu quis fazer de Chopin mas as teclas pareciam de ferro

E as notas zombavam de mim como se eu fosse um bobo

Quis até fazer de Dali mas os esquissos ficaram tão maus

Que cheguei a pensar cortar os dedos, para te poupar os olhos

 

O Nada enxovalhou-me, amor

Manda-me embora para que tudo volte ao princípio

Para te deixar descansar depois de mais um dia aurido

Eu sei que sonhaste comigo, sei que me sentiste

Pulsando, de mansinho, bem no fundo de ti, por todo o dia

Porque te deixei levar, por marotice, um pouco do meu cheiro

E claro que sim, também eu te mantive em segredo nas minhas mãos

Nos interstícios dos dentes, na fímbria das unhas, o nosso desejo

Deixa-me pensar que sendo teu vou chegar ao outro lado de mim

Em tuas margens ancorar, na esperança de honrar o meu destino
Contigo, meu amor antigo, minha história e meu castigo, minha amiga.